segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

No capô do carro, um pássaro azul e verde


Talvez poucos carreguem, no coração, um pássaro azul. No meu caso, ele é azul e verde. De toda forma, o que importa é que o trago no peito. E, agora, ao contrário de Charles, todos saberão que ele se encontra por aqui, dentro.

Mais do que no vidro do meu carro, ele pousou em mim, quando, me recusando a saltar, eu olhava à minha frente, pensando em nada e tudo ao mesmo tempo, tentando colocar em perspectiva a estrada, percorrida e a percorrer.

Tomei o seu pouso como uma mensagem (e assim faço com muitas coisas na vida) pois, no capô do carro, ele se demorou. Sem pressa, talvez porque eram seis e dez da manhã, e o vento da alvorada ainda carregava o fim da chuva da madrugada, do fresco do amanhecer. Sem medo, talvez porque confie nas suas asas, e por saber que poderá as bater sempre que se sentir inseguro, se dê o luxo da experiência e do explorar.

No fim das contas, foi isso mesmo que ele fez: voou. E eu, que nunca o quis guardado como um pacto secreto do meu coração, permiti a sua vida livre e o seu canto (não só quando estão todos ainda a dormir). Toda essa experiência, que me proporciona estes momentos de conexão, com Deus, e instalação da narrativa da minha vida nesta - única - realidade, me convence de que é suficiente - e uma dádiva - estar aqui. De que há muito para ver, sentir e fazer.

Engraçado, por fim, que ao digitar esse mini-enredo, por vezes bati na tecla do jogo da velha (#), e nela, prontamente, já se apresentava Bukowski como sugestão. Talvez os algoritmos tenham, mesmo, dominado as nossas vidas. Mas, prefiro ainda acreditar que guardamos domínio sobre muitas outras coisas. Por ter esta fé, para o meu pássaro azul e verde, eu abro as janelas.

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